Outro dia assisti a uma reportagem, da competente jornalista Mariana Leão, na Tv Record, a respeito das presidiárias que tem bebês na prisão. As presidiárias convivem com seus bebês, normalmente, em espaço físico próprio para aquelas nesta situação, até os seis meses de idade do neném. Amamentam, aquelas que querem e/ou podem, trocam fraldas, se dão a conhecer a seus filhotes, bem como têm tempo para conhecê-los, aninhá-los, confortá-los, amá-los, etc. Enfim, têm a oportunidade de lhes fornecer o "ambiente emocional" necessário para iniciar a construção das bases emocionais, que lhe permitirão vir a tranformar-se num ser humano autônomo, com potencialidades plenamente desenvolvidas, criativo, e capaz de contribuir para a sociedade em que vive - cultural e socialmente. Pois bem, tudo certo até aqui: o Estado assumindo seu compromisso, estabelecido no ECA (Estatuto da Criança e Adolescente) de proteger as crianças, e dar-lhes as condições de vida e saúde necessárias para seu crescimento.
No entanto, ao completar seis meses de idade o bebê é separado da mãe.
Assim mesmo: completou seis meses, vem uma profissional de um abrigo (ou algo que o valha) e leva embora o bebê. Detalhe: este bebê nunca conheceu esta pessoa que vem buscá-lo, nem tampouco a mãe a conheceu, este profissional não sabe nada a respeito dos gostos ou antipatias do neném, nem seu temperamento, nem a melhor forma de colocá-lo para dormir, ou tomar banho, ou comer, enfim, não sabe nada daquela pessoinha, que, do dia para a noite, literalmente, é lançada num universo totalmente desconhecido. Isto é realizado sem nenhum planejamento de transição. Seria mais ou menos como se você, leitor, dormisse em sua cama, quentinha, com os travesseiros que você gosta, os aromas já familiares à você, aquele colchão que você escolheu, etc, etc, e, acordasse no meio de uma rua do Japão, na idade média, por exemplo. Preciso explicar quão desconhecida e apavorante esta experiência poderia ser? Pois bem, um adulto, ou adolescente, aos poucos se adaptaria, encontraria meios de se comunicar, dizer da sua fome através de gestos, aprenderia até algumas palavras, tentaria , talvez, mudar sua aparência para se aproximar da aparência dos outros. Tudo muito bem. Só que um bebê não tem as ferramentas emocionais, nem cognitivas, nem mesmo físicas, para resolver suas necessidades, nem mesmo as mais básicas. Ele, aos seis meses, já aprendeu a expressar diversas das suas necessidades, DESDE QUE , tenha alguém ao seu lado que SAIBA RECONHECER ESTES SINAIS. Aquele sentimento de terrror que alguns poderiam imaginar terem sentido num primeiro momento acordando no Japão, é o sentimento que o bebê terá, só que sem ter condições de "digerir" , transformar e lidar com tais sentimentos. Ele se adaptará? É provável que sim. Mas, o que, para uma criança maior, ou um adolescente, ou um adulto seria uma fase de adaptação, que até geraria superações, talvez num breve espaço de tempo, até diversão, para um bebê será a porta de entrada de uma aventura sinistra, rumo às patologias emocionais mais graves: incluindo aí as psicoses, perversões e, pasmem, a delinquência. Parece familiar à vocês o aumento extraordinário da delinquência no país? Há mais de meio século, existe literatura psicanalítica à respeito da relação entre delinquência e neglicência emocional , sofrida nos primórdios da vida (veja em Bowlby, Winnicott, Mahler, Spitz, etc). Onde está o Estado? Do ponto de vista emocional, esta situação leva a mutilação emocional! Portanto deveria ser crime contra a sociedade e o cidadão, o bebê. Este com seu futuro gravemente comprometido, sem jamais ter tido escolha.